Hoje agarrei-me à poesia para dar cor ao dia. Estava a fazer-me impressão um céu, nem azul, nem cinzento. Apenas branco. Precisava de sol no meu dia, de cor, do cheiro a mar. Fui, assim, silenciosamente até ao “Caminho da Manhã” de Sofia de Mello Breyner. De imediato senti “a mão pesada do sol pousada” nos meus ombros “conduzida por uma luz levíssima e fresca”. Num arrepio, senti o conforto da luz do sol. Depois, fui seguindo o caminho da manhã e deixei-me tranquilizar pelo “puro branco, o branco da cal onde a luz cai a direito”. Com o inocente branco por companhia, guiada pelas palavras de Sofia senti o mar e deixei-me ficar de olhos fechados a ouvir o som da onda batida. Rápido voltei ao caminho e preparei-me para aquele desfiar de cores dos peixes que levam o mar até aquelas bancas de mercado. Como diz Sofia “e a luz se tornará líquida e o próprio ar salgado” pois é o mar que ali habita sem mais ninguém. Caminhei devagar pelas palavras, sôfrega da parte da parte de que mais gosto e leio para dentro de mim. Dos figos que “não são pretos: mas azuis e dentro são cor-de-rosa e de todos eles corre uma lágrima de mel”. Tão comovente esta lágrima de mel. É sempre aqui que fica preso o meu pensamento ainda que os meus olhos percorram o texto até ao fim.
Num domingo de céu, nem azul, nem cinzento, as palavras de Sofia trouxeram o quente e a cor ao meu dia e aos meus pensamentos. Do lindo texto do “caminho da manhã” saltei para a nossa realidade e pensei como, no nosso futuro, vamos ter que respirar solidariedade nas nossas atitudes e nas nossas palavras. Com os nossos amigos, com aqueles que conhecemos e com quem não conhecemos. Comprar uma flor porque precisamos de ver um sorriso, a quem oferecemos e a quem compramos. Vamos ter de ser seletivos nas nossas compras, mas que elas valham a pena, que não seja somente uma satisfação das nossas necessidades. Não podemos pensar que a nossa atitude não muda a vida dos outros. Sim, muda. E muito. Se andamos a apregoar abraços e festas de reencontro uma coisa é certa, podemos alimentar ainda mais a magia desse reencontro se mantivermos a nossa atitude de não deixar cair os pequenos negócios. Portugal, o miolo grande e suculento do nosso país, precisa de nós. É claro que devemos pensar nas imensas possibilidades que iremos receber do futuro, mas pelo meio estão as pessoas a viver a vida. Nas palavras e nas ações temos de estar com elas. Depois, o abraço ainda vai saber melhor e será mais sentido, tenho a certeza.
Num domingo de céu, nem azul, nem cinzento, mas apenas branco senti o sol, o mar, os amigos e o bem que estes nos fazem.