Também na área das artes culinárias as estrídulas jactâncias estão a atingir o cume na mesa do rei UBU. O bordão «melhor do mundo» escora todo o género de cometimentos na arte da cozinha e seu corrimento umbilical, a gastronomia. Tudo é o melhor do mundo – o assado caramelizado em demasia, o estufado a saber ligeiramente a bispo, o cozido para lá do encruado, o frito a ressumar a óleo, etc, etc. –, cozinheiros jactam-se de inventarem receitas abstrusas à mercê do ingénuo comentário do menino a soletrar O rei vai nu, enólogos procedem da mesma forma relativamente aos vinho, sejam tranquilos ou nervosos, produtores enveredam pelo mimetismo logrando tal como os restantes estrídulos discípulos do Senhor Pangloss aplausos de críticos e opinadores nestas matérias. Remar contra esta maré de hossanas e louvores é tarefa vã (nos tempos mais próximos) restando a todos quantos podem trinchar as causas das coisas do envaidecimento espúrio refugiarem-se na caverna de Platão e lerem “O Banquete ou do Amor ”, o “Banquete dos Eruditos”, e o Banquete de Kierkegaard. Os filisteus acusaram a ausência de pedantismo existencialista, eles desconhecem o sabor das palavras certas em épocas de triunfo do gato vendido por lebre, tamboril a fingir de lagosta, a fataça a imitar a corvina, a savelha frita servida como sendo linguado. Os exemplos no que concerne à representação gastronómica dentro do postulado do provérbio nem tudo o que reluz é ouro atingem cozinheiros, chefes, pasteleiros, enólogos e os ditos especialistas de generalidades gritando ao modo de pavões. Só que as suas plumagens são falsas, por isso mesmo fogem do confronto como o Diabo foge da cruz e quando interpelados charamelam explicações ou então não respondem. 

O mundo da gastronomia é cruel daí o vai e vem de restaurantes a abrirem e a encerrarem enquanto o Demónio esfrega um olho, desse ritmo – rapa, tira, deixa e põe – fica um rasto de falências, dívidas, processos em tribunal e currículos de nojo e fastio. O leitor faça o favor de fazer um rol destes nefastos inebriamentos e logo verificará a opulência dos atrevimentos da ignorância escorada em pesporrência porque os intérpretes não sabem o significado do sentido da medida. 

O que resta? Resta a honestidade de princípios – conhecimento do meio e das matérias-primas a transformar em prazer palatal porque a cozinha (rural, citadina, burguesa, clássica, contemporânea, de autor, tradicional ou temática) é bem cerzida e melhor servida por profissionais de raiz familiar ou vindos da Escola que para lá da higiene e apresentação praticam exemplarmente as regras polidas do cerimonial da restauração e da hotelaria. Aos clientes exige-se correcção e pagamento da conta. Se frequentamos os espaços de fast-food das grandes cadeias alimentares apercebemo-nos de outro tipo de jactância. É mansa, discreta, reluzente no afã da limpeza, do ganho de tempo, no sorriso profissional e nos ouvidos afinados dos guardiães da ordem e decoro. A estridência fica ao cuidado dos frequentadores, tudo o resto está arrematado e bem arrematado. O lucro é a ânima do negócio!